AS ETAPAS DA IMIGRAÇÃO ALEMÃ NO
RIO GRANDE DO SUL
O governo brasileiro, convencido
dos benefícios da imigração, enviou em 1822 à Europa o major Georg Anton
vonSchäffer para recrutar interessados em emigrar para o Brasil. O major viajou
primeiramente a Hamburgo negociando para estabelecer contrato e enviar
emigrantes para o Brasil primeiramente com o Grão-Ducado de
Mecklemburgo-Schwerin e depois com Birkenfeld, pertencente ao Ducado de
Oldenburgo. Para convencer os interessados, o governo brasileiro acenou com uma
série de vantagens: Passagem à custa do governo; concessão gratuita de um lote
de terra de 78 hectares; subsidio diário de um franco ou 160 réis a cada colono
no primeiro ano e metade no segundo; certa quantidade de roupas, bois, vacas,
cavalos, porcos e galinhas, na porção do número de pessoas de cada família;
isenção de dez anos no pagamento de direitos; liberdade de culto, e concessão
imediata da cidadania brasileira. Algumas promessas feriam a Constituição do
Império, como a liberdade de culto e a cidadania imediata, e o auxílio em
materiais e dinheiro nem sempre cumpriu o prometido. Há muitos relatos de
colonos vivendo os primeiros anos na miséria.
Em 1830, quando já estavam na
província mais de 5.300 alemães, pressões dos latifundiários levaram à
aprovação de uma nova Lei do Orçamento que proibiu qualquer despesa com
colonização, incluindo o pagamento de dívidas retroativas. A lei gerou sérias
dificuldades para os colonos que estavam se estabelecendo, impedindo que
recebessem os subsídios. A eclosão da Revolução Farroupilha em 1835 dividiu a
província e aumentou as dificuldades para a continuidade dos planos colonizadores
do governo, dificuldades complicadas porque a Lei nº 16 de 12 de agosto de 1834
havia transferido às províncias parte das responsabilidades pela organização do
projeto. Com esses transtornos, o fluxo de imigrantes reduziu muito mas não foi
interrompido inteiramente, e as áreas colonizadas aumentavam. No início da
Revolução a colonização alemã já se estendia para o norte de São Leopoldo com a
formação dos núcleos de Hamburgo Velho, Dois Irmãos, Bom Jardim, Quarenta e
Oito e São José do Hortêncio, e poucos anos depois passou a ser ocupada a Linha
Nova e a Picada Feijão.
Depois de terminada a Revolução,
o fluxo intensificou novamente, aumentado com a chegada de muitos emigrados que
viajavam por conta própria sem se integrar ao projeto do governo. Outras levas
foram trazidas para o povoamento de colônias privadas, como foi o caso da
fundação da Colônia de Santa Maria do Mundo Novo, em posse de Tristão José
Monteiro, que deu origem às cidades de Taquara, Igrejinha e Três Coroas, e da
Colônia Padre Eterno, ao lado da outra, hoje Sapiranga, de propriedade do Barão
do Jacuí. Até meados do século haviam chegado mais de oito mil alemães.
Nesta primeira etapa da
colonização, São Leopoldo e Hamburgo Velho foram os núcleos mais prósperos,
favorecidos pela proximidade com Porto Alegre, a capital da província, e pelo
controle de uma importante rede de vias de transporte terrestre e fluvial.
Esses núcleos em poucas décadas haviam se tornado vilas dinâmicas com um
comércio bem estruturado, uma expressiva produção rural concentrada no milho,
feijão, mandioca e tabaco, e diversas manufaturas e pequenas indústrias. Os
excedentes da produção abasteciam Porto Alegre e as regiões próximas e eram até
exportados. O crescimento econômico e urbano propiciava a formação de uma sociedade
nova e de uma cultura diferenciada nesta região. Também em Porto Alegre
formou-se uma comunidade alemã, que em meados do século já tinha quase dois mil
integrantes, ocupados em uma variedade de ofícios e empreendimentos.
A segunda etapa da colonização
inicia com uma série de ajustes na legislação. Em 1848 foram destinadas seis
léguas de terras devolutas em cada província para o exclusivo propósito de
colonização. Em 1850 os novos colonos passavam a ser naturalizados depois de
dois anos de residência e ficavam isentos do serviço militar, com exceção da
Guarda Nacional. No mesmo ano foi abolido o privilégio dos lotes gratuitos e
passou-se a cobrar por eles. Esta lei foi suplantada por uma lei provincial de
1851 que autorizou o retorno da distribuição gratuita de terras, mas as
dimensões médias dos lotes caíram de cerca de 77 para cerca de 49 hectares.
Ainda em 1851 foram contratados novos agentes de recrutamento. A gratuidade foi
abolida novamente em 1854, quando passou-se a cobrar 300 mil réis por cada cem
mil braças quadradas, mas a dívida podia ser quitada em cinco anos e retornaram
os subsídios em dinheiro, ferramentas e sementes. Em 1855 foi definida a
assistência aos imigrantes durante o transporte, em 1857 foram criados os
cargos de agente-intérprete e agente-mordomo, encarregados do recebimento e
tratamento dos imigrantes na capital e do seu encaminhamento para as colônias.
O governo imperial também procurava transferir às províncias todas as
responsabilidades que podia pela colonização.
Em 1849 foi fundada a colônia de
Santa Cruz do Sul no vale do Rio Pardo, a primeira inteiramente organizada pela
província, nas margens da recém aberta Estrada de Cima da Serra, que ligava o
importante entreposto comercial e base militar de Rio Pardo com as vacarias de
Soledade. Tendo Santa Cruz como base de apoio — se tornaria de fato a principal
cidade colonial alemã da região central da província nesta etapa — começaram a
ser povoadas áreas no vale do Rio Pardinho, surgindo os núcleos de Dona Josefa,
Linha Andréas, Sinimbu, Vila Tereza e Ferraz. As terras devolutas disponíveis
em breve acabaram, mesmo com a concessão de novas áreas pelo governo, e várias
outras colônias foram abertas por particulares ou suas áreas foram compradas a
particulares pelo governo, incluindo Rincão d'El Rey, Rio Pardense, Faxinal de
Dentro, Germânia, Entre-Rios, Formosa, Trombudo, Mato Leitão, Arroio do Meio,
Muçum, Estrela, Conventos, Pomerânia, Chaves, Linha João Alves, Santa Emília,
Sapé, Grão Pará, Cerro Alegre, Fazenda Carneiros, Travessa, São João da Serra,
Palanque, Pinheiral, Linha Nova e muitas outras. Abrir colônias era muito
vantajoso para os proprietários de grandes terras ociosas, o governo oferecia
incentivos e se bem conduzidos os projetos geravam grandes lucros. Também surgiam
as colônias de Feliz, Santo Ângelo (atual Agudo, Paraíso do Sul, Dona Francisca
e Cachoeira do Sul), Monte Alverne (Venâncio Aires) e Nova Petrópolis
(ampliação de São Leopoldo para o norte). No sul da província, surgiu em 1858,
no então quarto distrito de Pelotas, a Colônia São Lourenço.
Entre 1848 e 1874 chegaram mais
de 16 mil novos imigrantes, e neste período a população já residente aumentava
rápido, uma vez que os colonos em geral tinham muitos filhos. No fim deste
período todos os vales dos rios Caí, Taquari, Pardo, Pardinho, Sinos e parte do
Jacuí estavam ocupados por alemães e sua economia se expandia e diversificava,
para o agrado do governo, que via assim recompensados os seus longos esforços.
Segundo Olgário Vogt, "viajando por diversas cidades e regiões do Rio
Grande do Sul, no ano de 1871, o jornalista inglês Michael Mulhall,
estabelecido em Buenos Aires desde 1858, constatou que na província a
agricultura era, a essas alturas, quase exclusivamente da responsabilidade dos
colonos alemães. Eles constituiriam, então, somando imigrantes e seus
descendentes, cerca de 80 mil pessoas que estavam espalhadas por 42 colônias,
localizadas especialmente nos vales dos rios Jacuí, dos Sinos, Caí e Taquari.
Era principalmente devido a essas colônias que o Rio Grande granjeara o título
de Celeiro do Império Brasileiro". Apesar do resultado global positivo, a
situação dos casos individuais variava significativamente; muitas colônias
enfrentaram dificuldades, agitações ou permaneceram longas décadas com uma
economia de subsistência.
Entre 1874 e 1889 ingressaram na
província mais de 6 mil imigrantes, fundando os núcleos de Poço das Antas,
Forqueta, São Luiz, Marques de Souza, Bemfica, Bastos, Travesseiro, Pirajá,
Sete Léguas, Nova Württemberg, Barão do Triunfo, Aliança, Rolante, Arroio
Grande, Santa Helena, Rio da Ilha e muitos outros, praticamente todos sob a
direção de particulares. O governo nesta época estava mais ocupado com o início
da imigração italiana, que a partir de 1875 traria um contingente de imigrantes
muito maior que a imigração alemã total e o faria em muito menos tempo.
Com a Proclamação da República no
Brasil, as terras devolutas passaram para os estados, assim como a
responsabilidade pela colonização. O governo local positivista defendeu a
imigração espontânea e a colonização particular. Rapidamente, o planalto gaúcho
foi transformada em zona colonial, com a instalação das colônias novas de
iniciativa pública e privada, atraídas pelas possibilidades de exploração do
comércio de terras e pela obtenção de lucros fáceis.
Entre 1890 e 1914 chegaram mais
17 mil alemães. A fronteira da colonização no início do século XX chegou ao
noroeste do estado, criando Ijuí, Santa Rosa, entre outras, para logo depois
atravessar o Rio Uruguai e migrar para o oeste de Santa Catarina e Paraná, além
de colônias no norte da Argentina e no Paraguai. Depois da Primeira Guerra
Mundial a questão colonial voltou para o controle da União, e em virtude das
tendências nacionalistas dominantes foi imposto um limite à entrada de mais
estrangeiros. Mesmo assim, calcula-se que entre 1914 e 1939 chegaram mais de 30
mil alemães e austríacos, mas cerca de um terço deles não se fixou
permanentemente, mudando depois de alguns anos para outros estados. Dos que
ficaram, boa parte não acabou no campo nem foram pioneiros de novas colônias,
mas preferiram se estabelecer nas cidades já constituídas.
Passada a Segunda Guerra Mundial
a quantidade de imigrantes diminuiu muito, até se extinguir. A última colônia
formada foi de um grupo de famílias menonitas que tendo emigrado para Santa
Catarina na década de 1930, migraram para o Rio Grande do Sul, fixando-se ao
sul de Bagé entre 1949 e 1951.
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