AS ETAPAS DA IMIGRAÇÃO ALEMÃ NO RIO GRANDE DO SUL

AS ETAPAS DA IMIGRAÇÃO ALEMÃ NO RIO GRANDE DO SUL

O governo brasileiro, convencido dos benefícios da imigração, enviou em 1822 à Europa o major Georg Anton vonSchäffer para recrutar interessados em emigrar para o Brasil. O major viajou primeiramente a Hamburgo negociando para estabelecer contrato e enviar emigrantes para o Brasil primeiramente com o Grão-Ducado de Mecklemburgo-Schwerin e depois com Birkenfeld, pertencente ao Ducado de Oldenburgo. Para convencer os interessados, o governo brasileiro acenou com uma série de vantagens: Passagem à custa do governo; concessão gratuita de um lote de terra de 78 hectares; subsidio diário de um franco ou 160 réis a cada colono no primeiro ano e metade no segundo; certa quantidade de roupas, bois, vacas, cavalos, porcos e galinhas, na porção do número de pessoas de cada família; isenção de dez anos no pagamento de direitos; liberdade de culto, e concessão imediata da cidadania brasileira. Algumas promessas feriam a Constituição do Império, como a liberdade de culto e a cidadania imediata, e o auxílio em materiais e dinheiro nem sempre cumpriu o prometido. Há muitos relatos de colonos vivendo os primeiros anos na miséria.

 Os primeiros imigrantes zarparam no veleiro Protector do porto de Hamburgo em março de 1824. Depois de passarem pelo Rio de Janeiro, onde eram recebidos e distribuídos pelo Monsenhor Miranda, em 18 de julho de 1824 chegaram a São Leopoldo. Foram então enviados para a desativada Real Feitoria do Linho Cânhamo, onde chegaram em 25 de julho de 1824. Eram 39 pessoas de nove famílias. Ainda em 1824, com colonos não adaptados em São Leopoldo, foi criada uma colônia no povoado de São João, um dos antigos Sete Povos das Missões, mas a iniciativa fracassou completamente e os remanescentes foram recolhidos para São Borja. Em 1826 foram criadas as colônias de Três Forquilhas e Dom Pedro de Alcântara, mas eram bastante isoladas e permaneceram estagnadas. Em 1827 algumas famílias se mudaram de São Leopoldo para Santa Maria. Entre 1824 e 1828, Schaeffer teria trazido cerca de 4.500 soldados e colonos ao Brasil. Suas regões de origem eram diversas: Hunsrück, Saxônia, Württemberg, Coburgo, Holstein, Hamburgo, Mecklemburgo, Hanôver, Palatinado, Pomerânia e Vestfália.

Em 1830, quando já estavam na província mais de 5.300 alemães, pressões dos latifundiários levaram à aprovação de uma nova Lei do Orçamento que proibiu qualquer despesa com colonização, incluindo o pagamento de dívidas retroativas. A lei gerou sérias dificuldades para os colonos que estavam se estabelecendo, impedindo que recebessem os subsídios. A eclosão da Revolução Farroupilha em 1835 dividiu a província e aumentou as dificuldades para a continuidade dos planos colonizadores do governo, dificuldades complicadas porque a Lei nº 16 de 12 de agosto de 1834 havia transferido às províncias parte das responsabilidades pela organização do projeto. Com esses transtornos, o fluxo de imigrantes reduziu muito mas não foi interrompido inteiramente, e as áreas colonizadas aumentavam. No início da Revolução a colonização alemã já se estendia para o norte de São Leopoldo com a formação dos núcleos de Hamburgo Velho, Dois Irmãos, Bom Jardim, Quarenta e Oito e São José do Hortêncio, e poucos anos depois passou a ser ocupada a Linha Nova e a Picada Feijão.

 

Depois de terminada a Revolução, o fluxo intensificou novamente, aumentado com a chegada de muitos emigrados que viajavam por conta própria sem se integrar ao projeto do governo. Outras levas foram trazidas para o povoamento de colônias privadas, como foi o caso da fundação da Colônia de Santa Maria do Mundo Novo, em posse de Tristão José Monteiro, que deu origem às cidades de Taquara, Igrejinha e Três Coroas, e da Colônia Padre Eterno, ao lado da outra, hoje Sapiranga, de propriedade do Barão do Jacuí. Até meados do século haviam chegado mais de oito mil alemães.

Nesta primeira etapa da colonização, São Leopoldo e Hamburgo Velho foram os núcleos mais prósperos, favorecidos pela proximidade com Porto Alegre, a capital da província, e pelo controle de uma importante rede de vias de transporte terrestre e fluvial. Esses núcleos em poucas décadas haviam se tornado vilas dinâmicas com um comércio bem estruturado, uma expressiva produção rural concentrada no milho, feijão, mandioca e tabaco, e diversas manufaturas e pequenas indústrias. Os excedentes da produção abasteciam Porto Alegre e as regiões próximas e eram até exportados. O crescimento econômico e urbano propiciava a formação de uma sociedade nova e de uma cultura diferenciada nesta região. Também em Porto Alegre formou-se uma comunidade alemã, que em meados do século já tinha quase dois mil integrantes, ocupados em uma variedade de ofícios e empreendimentos.

A segunda etapa da colonização inicia com uma série de ajustes na legislação. Em 1848 foram destinadas seis léguas de terras devolutas em cada província para o exclusivo propósito de colonização. Em 1850 os novos colonos passavam a ser naturalizados depois de dois anos de residência e ficavam isentos do serviço militar, com exceção da Guarda Nacional. No mesmo ano foi abolido o privilégio dos lotes gratuitos e passou-se a cobrar por eles. Esta lei foi suplantada por uma lei provincial de 1851 que autorizou o retorno da distribuição gratuita de terras, mas as dimensões médias dos lotes caíram de cerca de 77 para cerca de 49 hectares. Ainda em 1851 foram contratados novos agentes de recrutamento. A gratuidade foi abolida novamente em 1854, quando passou-se a cobrar 300 mil réis por cada cem mil braças quadradas, mas a dívida podia ser quitada em cinco anos e retornaram os subsídios em dinheiro, ferramentas e sementes. Em 1855 foi definida a assistência aos imigrantes durante o transporte, em 1857 foram criados os cargos de agente-intérprete e agente-mordomo, encarregados do recebimento e tratamento dos imigrantes na capital e do seu encaminhamento para as colônias. O governo imperial também procurava transferir às províncias todas as responsabilidades que podia pela colonização.

Em 1849 foi fundada a colônia de Santa Cruz do Sul no vale do Rio Pardo, a primeira inteiramente organizada pela província, nas margens da recém aberta Estrada de Cima da Serra, que ligava o importante entreposto comercial e base militar de Rio Pardo com as vacarias de Soledade. Tendo Santa Cruz como base de apoio — se tornaria de fato a principal cidade colonial alemã da região central da província nesta etapa — começaram a ser povoadas áreas no vale do Rio Pardinho, surgindo os núcleos de Dona Josefa, Linha Andréas, Sinimbu, Vila Tereza e Ferraz. As terras devolutas disponíveis em breve acabaram, mesmo com a concessão de novas áreas pelo governo, e várias outras colônias foram abertas por particulares ou suas áreas foram compradas a particulares pelo governo, incluindo Rincão d'El Rey, Rio Pardense, Faxinal de Dentro, Germânia, Entre-Rios, Formosa, Trombudo, Mato Leitão, Arroio do Meio, Muçum, Estrela, Conventos, Pomerânia, Chaves, Linha João Alves, Santa Emília, Sapé, Grão Pará, Cerro Alegre, Fazenda Carneiros, Travessa, São João da Serra, Palanque, Pinheiral, Linha Nova e muitas outras. Abrir colônias era muito vantajoso para os proprietários de grandes terras ociosas, o governo oferecia incentivos e se bem conduzidos os projetos geravam grandes lucros. Também surgiam as colônias de Feliz, Santo Ângelo (atual Agudo, Paraíso do Sul, Dona Francisca e Cachoeira do Sul), Monte Alverne (Venâncio Aires) e Nova Petrópolis (ampliação de São Leopoldo para o norte). No sul da província, surgiu em 1858, no então quarto distrito de Pelotas, a Colônia São Lourenço.

Entre 1848 e 1874 chegaram mais de 16 mil novos imigrantes, e neste período a população já residente aumentava rápido, uma vez que os colonos em geral tinham muitos filhos. No fim deste período todos os vales dos rios Caí, Taquari, Pardo, Pardinho, Sinos e parte do Jacuí estavam ocupados por alemães e sua economia se expandia e diversificava, para o agrado do governo, que via assim recompensados os seus longos esforços. Segundo Olgário Vogt, "viajando por diversas cidades e regiões do Rio Grande do Sul, no ano de 1871, o jornalista inglês Michael Mulhall, estabelecido em Buenos Aires desde 1858, constatou que na província a agricultura era, a essas alturas, quase exclusivamente da responsabilidade dos colonos alemães. Eles constituiriam, então, somando imigrantes e seus descendentes, cerca de 80 mil pessoas que estavam espalhadas por 42 colônias, localizadas especialmente nos vales dos rios Jacuí, dos Sinos, Caí e Taquari. Era principalmente devido a essas colônias que o Rio Grande granjeara o título de Celeiro do Império Brasileiro". Apesar do resultado global positivo, a situação dos casos individuais variava significativamente; muitas colônias enfrentaram dificuldades, agitações ou permaneceram longas décadas com uma economia de subsistência.

Entre 1874 e 1889 ingressaram na província mais de 6 mil imigrantes, fundando os núcleos de Poço das Antas, Forqueta, São Luiz, Marques de Souza, Bemfica, Bastos, Travesseiro, Pirajá, Sete Léguas, Nova Württemberg, Barão do Triunfo, Aliança, Rolante, Arroio Grande, Santa Helena, Rio da Ilha e muitos outros, praticamente todos sob a direção de particulares. O governo nesta época estava mais ocupado com o início da imigração italiana, que a partir de 1875 traria um contingente de imigrantes muito maior que a imigração alemã total e o faria em muito menos tempo.

Com a Proclamação da República no Brasil, as terras devolutas passaram para os estados, assim como a responsabilidade pela colonização. O governo local positivista defendeu a imigração espontânea e a colonização particular. Rapidamente, o planalto gaúcho foi transformada em zona colonial, com a instalação das colônias novas de iniciativa pública e privada, atraídas pelas possibilidades de exploração do comércio de terras e pela obtenção de lucros fáceis.

Entre 1890 e 1914 chegaram mais 17 mil alemães. A fronteira da colonização no início do século XX chegou ao noroeste do estado, criando Ijuí, Santa Rosa, entre outras, para logo depois atravessar o Rio Uruguai e migrar para o oeste de Santa Catarina e Paraná, além de colônias no norte da Argentina e no Paraguai. Depois da Primeira Guerra Mundial a questão colonial voltou para o controle da União, e em virtude das tendências nacionalistas dominantes foi imposto um limite à entrada de mais estrangeiros. Mesmo assim, calcula-se que entre 1914 e 1939 chegaram mais de 30 mil alemães e austríacos, mas cerca de um terço deles não se fixou permanentemente, mudando depois de alguns anos para outros estados. Dos que ficaram, boa parte não acabou no campo nem foram pioneiros de novas colônias, mas preferiram se estabelecer nas cidades já constituídas.

Passada a Segunda Guerra Mundial a quantidade de imigrantes diminuiu muito, até se extinguir. A última colônia formada foi de um grupo de famílias menonitas que tendo emigrado para Santa Catarina na década de 1930, migraram para o Rio Grande do Sul, fixando-se ao sul de Bagé entre 1949 e 1951.

 

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