A PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA
RIO-GRANDENSE
No início de setembro de 1836
Antônio de Sousa Neto deslocou-se à região de Bagé, onde o imperial João da
Silva Tavares, vindo do Uruguai, mantinha o desassossego entre os farroupilhas
residentes. A Primeira Brigada de Neto, com quatrocentos homens atravessou o
arroio Seival e encontrou as tropas de Silva Tavares (560 homens) sobre uma coxilha.
Era a tarde de 10 de setembro de 1836 quando começou a batalha do Seival. Silva
Tavares desceu a coxilha em desabalada carga. Neto ordenou também a carga de
lança e espada, sem tiros. As forças se encontraram em sangrento combate. Silva
Tavares fugiu e seus homens foram derrotados. Os farrapos ficaram quase
intactos, enquanto do outro lado havia 180 mortos, 63 feridos e 100
prisioneiros.
Donos do campo, os farroupilhas
comemoraram vibrantemente a vitória. Cresceu a vontade separatista de
conquistar e manter um país rio-grandense independente, entre as nações do
mundo. À noite as questões ideológicas foram revistas e Lucas de Oliveira e
Joaquim Pedro, republicanos ardorosos, catequizaram Neto, argumentando que não
havia outra saída a não ser enveredar pela senda da independência e que não
havia outro desejo popular a não ser o desejo de liberdade, de abolição da
escravatura e de democracia sob o sistema republicano. Se tivesse que
acontecer, a hora era aquela, a hora da vitória, do júbilo, da afirmação. Neto
passou a simpatizar com a ideia, mas resistiu diante de uma provável reprovação
de seus pares. Pensava que tal proclamação de uma nova República deveria partir
de Bento Gonçalves, o grande comandante de todos os farrapos. Contrapuseram que
Bento já se decidira pela república, que hierarquia rígida era coisa do império
e que o sistema republicano centrava-se no povo, suas vontades e necessidades,
e não na elite governativa.
Finalmente, aquiescendo o coronel
Neto, passaram a escrever a Proclamação da República Rio-Grandense que seria
lida e efetivada por ele, perante a tropa perfilada, em 11 de setembro de 1836.
“Bravos companheiros da 1ª Brigada de Cavalaria!
Ontem obtivestes o mais completo triunfo sobre os escravos da Corte do
Rio de Janeiro, a qual, invejosa das vantagens locais de nossa província, faz
derramar sem piedade o sangue de nossos compatriotas, para deste modo fazê-la
presa de suas vistas ambiciosas. Miseráveis! Todas as vezes que seus vis
satélites se têm apresentado diante das forças livres, têm sucumbido, sem que
este fatal desengano os faça desistir de seus planos infernais.
São sem número as injustiças feitas pelo Governo. Seu despotismo é o
mais atroz. E sofreremos calados tanta infâmia? Não, nossos companheiros, os
rio-grandenses, estão dispostos, como nós, a não sofrer por mais tempo a
prepotência de um governo tirânico, arbitrário e cruel, como o atual. Em todos
os ângulos da província não soa outro eco que o de independência, república,
liberdade ou morte. Este eco, majestoso, que tão constantemente repetis, como
uma parte deste solo de homens livres, me faz declarar que proclamemos a nossa
independência provincial, para o que nos dão bastante direito nossos trabalhos
pela liberdade, e o triunfo que ontem obtivemos, sobre esses miseráveis
escravos do poder absoluto.
Camaradas! Nós que compomos a 1ª Brigada do Exército Liberal, devemos
ser os primeiros a proclamar, como proclamamos, a independência desta
província, a qual fica desligada das demais do Império, e forma um estado livre
e independente, com o título de República Rio-grandense, e cujo manifesto às
nações civilizadas se fará competentemente. Camaradas! Gritemos pela primeira
vez: viva a República Rio-grandense! Viva a independência! Viva o exército
republicano rio-grandense!
Campo dos Menezes, 11 de setembro de 1836 – Antônio de Sousa Netto,
coronel-comandante da 1ª brigada.”
Nesse ponto o enfoque histórico
muda de rumo. A "Revolta" ou "Revolução Farroupilha" dá
lugar à guerra entre duas nações soberanas. Os historiadores se dividem:
concretizou-se ou não o nascimento de um novo país? De qualquer forma, a
disputa bélica a partir daí é preferencialmente[carece de fontes] chamada
Guerra dos Farrapos do que Revolução Farroupilha, embora ambas as denominações
sejam usadas, indistintamente, por outros autores, para todo o período desse
confronto bélico.
Após a cerimônia de Proclamação,
irromperam todos em gritos de euforia, liberdade e vivas à República, com tiros
para o alto e cantorias. Logo chegou a galope o tenente Teixeira Nunes, empunhando
pela primeira vez a bandeira tricolor, mandada fazer às pressas em Bagé e passa
a desfilar por entre seus companheiros com a bandeira verde, vermelha e amarela
da República Rio-Grandense, comemorando sua independência.
Foram conclamadas as demais
províncias brasileiras a unirem-se como entes federados no sistema republicano,
foi criado um hino nacional e bandeira própria do novo estado, até hoje
cultivados pelo Estado do Rio Grande do Sul. Também foi estabelecida a capital
na pequena cidade de Piratini, donde surgiu uma nova alcunha, a República de
Piratini.
A partir deste momento, ocorreu a
falência imediata da Revolta Farroupilha e o início da Guerra dos Farrapos
propriamente dita. A mudança de posicionamento dos Farrapos foi imediata. Já
não desejavam mais substituir o Presidente da Província de São Pedro do Rio
Grande por outro, pois agora haveriam de ter um Presidente da República
independente. Os combatentes não era mais revoltosos farroupilhas, mas soldados
do Exército Republicano Rio-Grandense. O pavilhão que defendiam não era mais a
bandeira imperial verde-amarela, mas a quadrada bandeira republicana verde,
vermelha e amarela em diagonal (sem o brasão no meio). Não lutavam mais por
reconhecimento e atenção, mas pela defesa da independência e soberania de seu
país. Já não era mais a luta de revoltosos em busca de justiça, mas uma guerra
de exército defensor (republicano) contra exército agressor (imperial);
A república Rio-grandense tinha
escasso apoio nas áreas colonizadas pela recente imigração alemã. Esses
imigrantes haviam se fixado na desativada Real Feitoria do Linho Cânhamo em
colônias cedidas pelo império, no Vale do Rio dos Sinos. Em Porto Alegre,
apesar da simpatia de parte das camadas médias, não recebia o apoio popular,
que mobilizava outras cidades da Província de São Pedro do Rio Grande.
Inicialmente sua base social era originária de liberais, militares, industriais
do charque e, especialmente, de estancieiros com capacidade de liderar
exércitos particulares de "peões", vaqueiros que lhes prestavam
serviços ou deles dependiam para subsistência e defesa e cuja obediência e
fidelidade era garantida por traços feudais da cultura local; e por escravos,
que no meio rural eram incluídos no convívio social dos peões. Como havia
interfaces com o Uruguai, também eram contratados elementos de lá provenientes.
Os exímios cavaleiros forjados nas lides campeiras, chamados
"gaúchos", formavam corpos de cavalaria de choque aptos a travar uma
guerra de guerrilha. Esses exércitos dispunham de alta mobilidade e
conhecimento do terreno, mas sem dispor de infantaria nem adequada artilharia,
os Farroupilhas tinham fraca capacidade bélica contra as cidades fortificadas
do Rio Grande e Porto Alegre, e pouca capacidade de defesa das praças que
controlavam.
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