OS TROPEIROS E O CAMINHO DAS
TROPAS
Na região sul do Brasil,
"tropeiro" era o condutor de tropas de muares da cidade de Viamão,
Rio Grande do Sul, até Sorocaba, São Paulo. Essas tropas abasteciam o ciclo do
ouro em Minas Gerais no século XVIII. Essa atividade foi responsável pela
fundação de inúmeras cidades nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e
Paraná.
Ao longo do século XVIII, a
economia colonial crescia, e com ela, a necessidade de abastecer os centros
urbanos que floresciam, sobretudo nas Minas Gerais. Os arraiais que se formavam
em torno das novas jazidas necessitavam ser abastecidos por gêneros,
transportados no lombo de mulas, únicos animais que conseguiam resistir com
carga a percorrer grandes distâncias por caminhos muitas vezes impraticáveis.
Aos grupos de animais reunidos para esse fim dava-se o nome de
"tropas" e aos seus condutores, o de "tropeiros".
Em Sorocaba, no interior de São
Paulo aconteciam grandes feiras durante todo o ano, ali sendo comerciados
animais e gêneros para os garimpeiros e exploradores. Os comerciantes
deslocavam-se entre o Rio Grande do Sul e São Paulo, transportando bois,
cavalos, mulas e gêneros regionais. Em 1680, os jesuítas estabeleceram-se na
região das Missões, no atual Rio Grande do Sul. Trouxeram com eles o gado que
multiplicou-se livre e grandemente nas pradarias dos Pampas gaúchos. Com o
advento da descoberta do ouro nas Minas Gerais, houve um grande aumento na
demanda de carne (charque) e, também, de couro para os alforjes do transporte
do ouro até a metrópole portuguesa. Criou-se então, no Continente de São Pedro,
hoje estado do Rio Grande do Sul, formada por paulistas, índios e castelhanos -
o futuro homem gaúcho -, uma enorme rede de preação, abate de gado e salga. A
Estância do Viamão era o grande mercado onde se comercializava esses produtos,
por isso o nome Real Caminho do Viamão.
O Caminho das Tropas começou a
ser descrito e representado, em mapas e pinturas, a partir do início do século
XIX, mas foi estabelecido ao longo do período colonial, com aproveitamento de
vários caminhos indígenas anteriores ao século XVI: haviam servido ao comércio
de charque do Rio Grande do Sul e de muares do Paraguai, nos séculos XVIII e
XIX, mas anteriormente percorridas pelas bandeiras de apresamento de indígenas
no século XVII, provavelmente sobre parte do antigo caminho indígena do
Peabiru, que ligava a região da hoje São Vicente aos atuais Paraná e Paraguai.
Na “Estatística da Imperial
Província de São Paulo” (1827), de José Antônio Teixeira Cabral, o autor
indica, como a “7ª Estrada” (entre as sete estradas principais da Província de
São Paulo), aquela que, no século XX, ligava São Paulo a Itapetininga
(posteriormente convertida na Rodovia Raposo Tavares) e prosseguia para o Sul. De
acordo com esse documento, a estrada iniciava-se na capital, com um trecho no
sentido oeste passando por Cotia (com ramificação para Una, atual Ibiúna), São
Roque (com ramificação para Santana de Parnaíba), Sorocaba, Itapetininga (com
ramificação para Paranapanema), Itapeva e Faxina (com ramificação para Apiaí),
seguido de trecho no sentido sudoeste, passando por Castro (antiga Iapó), e
trecho no sentido sul, passando por Guarapuava e, em seguida, dividindo-se em
um ramo que seguia para Curitiba e outro, mais longo, para a Vila do Príncipe
(atual Lapa). A partir da Vila do Príncipe, prosseguia por 40 léguas, com o
nome de Estrada da Mata, até a divisa com a Província de Santa Catarina e, daí,
até o Rio Grande do Sul.
A maioria das paisagens desenhadas por Jean-Baptiste Debret em 1827 (provavelmente a partir de desenhos de outros artistas ou de integrantes de sua equipe),a oeste da cidade de São Paulo e ao sul da Província de São Paulo, foram realizadas em vilas ou freguesias nas estradas e ramificações do Caminho das Tropas: Itu, Porto Feliz, Sorocaba, Itapeva, Jaguariaíva (junto ao rio de mesmo nome), Castro (antiga Iapó), Ponta Grossa, Guarapuava, Curitiba, Lapa (antiga Vila do Príncipe), Paranaguá, Desterro (atual Florianópolis), São Pedro do Sul (atual Porto Alegre) e várias outras.[6] As paisagens de Jean-Baptiste Debret são, portanto, as mais antigas imagens tomadas do Caminho das Tropas, as quais eram, basicamente, caminhos de terra de poucos metros de largura, sobre montanhas e vales sinuosos, por entre matas, capoeiras e campos, com algumas pontes rudimentares de madeira, e que, muitas vezes, incluíam a travessia de rios pela água.
Um dos mais antigos mapas que
representam o Caminho das Tropas é o "Guia de Caminhantes", de
Anastácio Santana (1817), porém dezenas de mapas, ao longo do século XIX,
enfatizaram os troncos principais do caminho que ligava São Paulo a Castro e
daí a Lapa, rumo a Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Na segunda metade do
século XIX e princípios do século XX, no entanto, os mapas do Brasil passaram a
destacar as ferrovias, em período cuja tendência predominante foi a construção
de redes ferroviárias. Ao longo do século XX, o Caminho das Tropas foi dividido
em vários trechos, administrados por governos ou empresas privadas (e parcialmente
asfaltado a partir da década de 1950), reaparecendo nos mapas como rodovias.
Os tropeiros seguiam por antigos
caminhos indígenas e outros, abertos pelas tropas de mulas e pelas boiadas.
Essas trilhas de e para o Sul eram chamadas genericamente de Caminho das
Tropas, e compunham-se por quatro vias principais:
o Caminho do Viamão, também
designado como "Estrada Real", a mais utilizada, partia de Viamão,
atravessava os campos de Vacaria, Lages, Correia Pinto, Curitibanos, Santa
Cecília, Papanduva, Monte Castelo, Mafra, Rio Negro, Campo do Tenente, Lapa,
Palmeira, Ponta Grossa, Castro, Piraí do Sul, Jaguariaíva, Sengés, Itararé,
alcançando Sorocaba. Na “Estatística da Imperial Província de São Paulo”
(1827), o trecho desse caminho que ligava os atuais estados do Paraná a Santa
Catarina também era denominado Estrada da Mata.
o Estrada das Missões, partia dos
campos de São Borja, seguia por Santo Ângelo, Palmeira das Missões, Rodeio,
Chapecó, Xanxerê, Palmas, onde se bifurcava por União da Vitória e Palmeira, e
por Guarapuava, Imbituva e Ponta Grossa.
o Caminho da Vacaria, que
interligava Cruz Alta a Vacaria, no Caminho do Viamão, passando por Passo Fundo
e Lagoa Vermelha.
o Caminho da Praia, que
interligava a Colônia de Sacramento no atual Uruguai a Laguna, ia pelo Litoral
desde a altura de Montevidéu, atravessando o Rio Chuí, depois o canal de Rio
Grande onde desde 1725 havia a tarifação para o transporte do gado, atravessava
o rio Mampituba na atual divisa dos Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina,
cruzava o Rio Araranguá, que dá nome à cidade catarinense, e chegava a Laguna.
Inicialmente era utilizado como forma de ligação entre Laguna, entreposto
importante na expansão luso-brasileira para o Sul da América, na falta de
segurança na navegação por conta dos conflitos contra a Espanha. No início da
utilização dessa rota como caminho de tropa, a mesma ia até São Francisco do
Sul e subia o caminho dos Ambrósios, na Serra Geral a caminho de Curitiba.
Também foi aberta uma estrada que ligava Araranguá ao Planalto Catarinense,
chamada de Caminho dos Conventos, uma opção para transpor a serra e pegar o
Caminho do Viamão em direção a Sorocaba. Com o tempo foi ficando esquecido para
o comércio com Sorocaba, pois a utilização do Caminho de Viamão facilitava o
transporte e tarifação das tropas, ficando como caminho auxiliar na ligação das
estâncias instaladas no litoral entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
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