BRASIL COLONIAL PARA ALÉM DO AÇÚCAR


 

AS ATIVIDADES COMPLEMENTARES NO BRASIL COLÔNIA

Durante o Período Colonial brasileiro, a preocupação central da Coroa portuguesa foi o desenvolvimento de atividades econômicas que coincidissem com o ideal mercantilista, ou seja, no projeto de acumulação de divisas que atendessem ao Estado lusitano.

A opção pelo plantio da cana-de-açúcar e o estabelecimento do monopólio real na exploração do pau-brasil são alguns exemplos das ações mercantilistas empreendidas na área colonial. A mineração, que assumiu papel de destaque nos interesses da metrópole no trato das questões coloniais, principalmente no século XVIII, também foi uma atividade muito rentável para os portugueses.

Porém, cabe ressaltar que essas atividades econômicas foram acompanhadas de outras de menor relevância para a Coroa portuguesa, mas que podem ser consideradas fundamentais para a estruturação do modelo colonial proposto. Entre essas atividades, podem ser destacadas a pecuária e a extração das drogas do sertão, por exemplo.

PECUÁRIA

Transferida para o Brasil nas primeiras décadas do século XVI, a pecuária bovina era desconhecida dos povos indígenas na América. O governador Tomé de Souza foi um dos responsáveis por trazer alguns animais originados das ilhas de Cabo Verde com o objetivo de suprir a alimentação dos colonos na cidade de Salvador. Além de garantir a subsistência por meio da carne, do leite e da manteiga de garrafa, o gado bovino contribuiu para a força motriz dos engenhos, sendo utilizado como meio de transporte e, a partir de seu couro, confeccionavamse calçados, roupas, móveis e os mais variados objetos.

A destinação das terras férteis às atividades da cana-deaçúcar, com o decorrer das décadas, no entanto, obrigou os criadores a buscarem nas regiões interioranas pastagem para o gado que se multiplicava. A própria Coroa portuguesa notou a necessidade de separar a criação de gado e a agricultura exportadora, ao decretar, na Carta Régia de 1701, a proibição da criação de currais na faixa de 50 km da costa. Porém, bem antes da notificação oficial, o gado teve seu caminho natural no interior da colônia, irradiando seu avanço a partir das regiões da Bahia, Pernambuco e Maranhão.

As margens do Rio São Francisco se transformaram em espaço ideal para a fundação de fazendas de gado, passando inclusive a ser conhecido como o Rio dos Currais. No início do século XVIII, a região de Pernambuco já apresentava aproximadamente 800 mil cabeças de gado espalhadas em mais de oitenta currais, que, somadas às 500 mil cabeças de gado da Bahia, garantiam o abastecimento dos núcleos urbanos e das fazendas em expansão.

A presença da mão de obra livre foi mais comum nessa atividade, apesar da baixa quali cação social dos envolvidos, que em geral eram indígenas, mestiços e negros alforriados. Geralmente, os vaqueiros eram recompensados com o recebimento de parte das crias obtidas pelo rebanho, o que permitia uma relativa ascensão social.

No entanto, a criação extensiva e o caráter nômade da pecuária inviabilizavam uma sofisticação social e patrimonial então vigente nas estruturas produtivas da cana-de-açúcar. Esse cenário, no entanto, não impediu o enriquecimento de muitos proprietários com a atividade da pecuária no Brasil. Cabe ressaltar também a possibilidade de faturamento por meio da exploração do couro, que chegou a ser destaque nas exportações brasileiras durante o Período Colonial.

PECUÁRIA DO SUL

O gado foi introduzido na região Sul da colônia portuguesa por meio dos jesuítas, que utilizavam os animais para a subsistência nas missões fundadas ainda no século XVI. No contexto da União Ibérica, o Nordeste brasileiro e as praças africanas foram invadidos pelos holandeses, provocando a escassez do escravo negro nas regiões não dominadas pelos flamengos, como a capital Salvador. Diante dessa demanda, os paulistas perceberam a possibilidade de enriquecimento e começaram a atacar as missões jesuíticas do sul para capturar os índios que pudessem ser comercializados nas áreas sedentas de braços escravos.

A destruição das missões acabou por provocar o surgimento do gado selvagem, que se espalhou com facilidade pela região em virtude da abundância de pastagem natural que as áreas do Rio Grande do Sul forneciam. Após a União Ibérica (1640), enfim, portugueses e nativos notaram o próspero cenário de lucratividade e, dessa forma, capturavam os animais para a obtenção do couro, objeto de interesse dos exportadores das cidades de Buenos Aires e Sacramento, cidade portuguesa fundada na margem posterior do Rio da Prata e dedicada às atividades ilícitas em pleno território colonial espanhol.

A consolidação da pecuária no Sul ocorreu apenas a partir da primeira metade do século XVIII, quando do início da atividade de mineração na região das Minas Gerais. A maioria dos mineradores focava seus esforços na extração do ouro e do diamante, passando a depender do abastecimento externo ao universo mineiro.

O gado do Sul passou a ser essencial para a dinâmica econômica e social da região mineira, sendo o preço dos animais vivos muito elevado. Nesse contexto, formou-se a atividade do tropeiro, responsável pelas tropas de peões que capturavam e comercializavam os animais nas diversas regiões do Brasil.

O avanço do século XVIII marcou a extinção do gado selvagem e o gaúcho foi obrigado a fundar fazendas de criação para manter as atividades econômicas de abastecimento de outras áreas coloniais. Eram as chamadas estâncias, comuns na região platina e intensificadas no extremo sul do Brasil por incentivo da Coroa portuguesa, preocupada em garantir a ocupação desses territórios e evitar as ameaças nas fronteiras com a América Espanhola. Mesmo assim, a intensificação da atividade de plantio de trigo e produção do charque não evitou contendas e escaramuças com o Império Espanhol, e, posteriormente, com as nações platinas, perdurando até a segunda metade do século XIX, já no Período Imperial brasileiro.

DROGAS DO SERTÃO

 O interior do território colonial brasileiro, comumente classificado sertão, também contribuiu, mesmo que de modo tímido, para a dinâmica econômica nos séculos de domínio português. Entre as principais atividades desenvolvidas na região, destacou-se a exploração das drogas do sertão, expressão utilizada para designar alimentos e plantas medicinais que passaram a ser extraídas da atual região amazônica. A dificuldade de se ocupar esse território, presente ainda nos dias de hoje, indica a fragilidade dessa atividade econômica. Soma-se a isso a distância da região em relação aos principais centros consumidores europeus, dificultando a regularidade do comércio de produtos como cravo, castanha, canela, cacau, guaraná, entre outros.

A mão de obra era indígena e recrutada pelos jesuítas, que foram responsáveis pela fundação de dezenas de missões na Bacia do Rio Amazonas. Nesse sentido, a ocupação religiosa da região foi de extrema importância para garantir, no século XVIII, a expansão das fronteiras luso-brasileiras para além do Tratado de Tordesilhas, reconhecidas por meio do Tratado de Madri de 1750.

Cabe ainda ressaltar que o estímulo à extração dessas plantas na região amazônica se vinculava ao interesse europeu pelas folhas exóticas do Novo Mundo, visto a precariedade dos conceitos medicinais na Europa Moderna. Sendo assim, a extração das drogas do sertão atendia aos interesses mercantilistas portugueses, afinal, o alto preço atribuído a esses produtos beneficiava os metropolitanos.

TABACO

Planta típica da América, o tabaco era muito utilizado pelas comunidades indígenas. A sua utilização era comum nas experiências do dia a dia e nas importantes cerimônias das tribos tupis, sendo a aspiração da fumaça do tabaco estimuladora para o transe místico nas celebrações religiosas. Até os dias de hoje, algumas comunidades descendentes dos ameríndios mantêm a tradição de fumar em eventos festivos.

Com a chegada dos portugueses, o cultivo do tabaco se transformou em importante atividade econômica. Segundo o padre Antonil, português que circulou pelas terras coloniais no nal do século XVII, o tabaco representava a segunda principal atividade agrícola em solo brasileiro, perdendo apenas para o cultivo da cana-de-açúcar. A Coroa portuguesa chegou a criar a Junta do Tabaco em 1674 com o intuito de melhor gerenciar essa atividade econômica.

O mercado do tabaco se concentrava no exterior, sendo a região da costa africana o principal centro comercial. O tabaco era utilizado como moeda de troca nas comunidades africanas que forneciam seus adversários como cativos em troca de qualquer produto que lhes parecesse vantajoso. A Europa também se deixou levar pelos maléficos prazeres do tabaco, apesar das insistentes proibições papais. Esse lucrativo negócio apresentava outra vantagem, além do vasto mercado: o baixo custo para obtenção do fumo. De modo geral, os investimentos eram reduzidos quando comparados com a atividade canavieira, sendo que as pequenas e médias propriedades ligadas ao plantio tinham em torno de 5 a 10 escravos.

ALGODÃO

Também conhecido pelos povos nativos, o algodão era utilizado para tecer redes de dormir e objetos do cotidiano. Com a intensificação da presença lusitana em solo brasileiro, a partir do século XVII, fez-se necessário o desenvolvimento da agricultura do algodão com o intuito de se produzir tecido cru para a dinâmica interna da área colonial. As fazendas produtoras de algodão se destacaram nas regiões dos atuais territórios do Pará e do Maranhão, mas se tem notícias desse tipo de atividade na longa faixa litorânea que vai da capitania de São Vicente até o Ceará. Até a capitania de Minas Gerais, no contexto da decadência da mineração, desenvolveu a atividade produtora de algodão como alternativa em meio à crise aurífera.

A produção de algodão garantia a fabricação de redes, chapéus, vestimentas para a escravaria e, em alguns momentos, de panos nos que concorriam com os tecidos oriundos da metrópole. A crise do sistema colonial português no final do século XVIII contribuiu para que a produção de algodão do Brasil atingisse mercados externos, sedentos de matéria-prima para as manufaturas e indústrias em plena expansão. Não foi por acaso que, em 1785, a rainha portuguesa Maria I expediu um alvará proibindo manufaturas no Brasil, contribuindo para a falência de muitos produtores de algodão.

 

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