O ABSOLUTISMO NA FRANÇA
Foi provavelmente na França que a
monarquia absolutista atingiu o seu auge. Durante a dinastia dos Bourbon, o
poder político se concentrou nas mãos dos reis até atingir seu ponto máximo no
reinado de Luís XIV (1643-1715), que foi proclamado o Rei Sol. No entanto,
alguns obstáculos dificultaram o processo de concentração do poder político ao
longo da história do absolutismo francês.
Os Bourbon ascenderam ao poder em
um período conturbado da história francesa, quando as disputas religiosas
dividiam o reino. A expansão do calvinismo provocava conflitos entre católicos
e protestantes, opondo a nobreza católica, Partido Papista, aos nobres e
burgueses protestantes, do Partido Huguenote. As guerras de religião, desse
modo, dificultaram a consolidação do absolutismo na França.
Nesse contexto, foi planejado o
casamento entre Margarida de Valois, a católica rainha Margot, e Henrique de
Bourbon, protestante. O casamento de Margot e Henrique foi acertado por suas
mães, Catarina de Médici e Jeanne d’Albret. O objetivo era não só consolidar a
paz entre católicos e protestantes, mas também estabelecer uma aliança entre os
Valois e os Bourbon. Os Valois estavam no trono da França há dois séculos, já
os Bourbon nunca haviam chegado ao poder.
A rainha-mãe, Catarina de Médici
– que, na prática, governava –, visava, ainda, com o casamento, à consolidação
do poder de sua família e à contenção do poder de outra importante família, a
dos Guise. A política de Catarina consistia em aliar-se ora a um, ora a outro
dos partidos em luta, evitando que um deles tivesse força su ciente para
derrubá-la.
Após o casamento de sua lha, a
rainha, ao perceber o aumento do poder dos protestantes, tramou, junto ao duque
de Guise, o assassinato do almirante Coligny, principal chefe huguenote. A
situação saiu de controle e o que se observou foi o massacre dos protestantes
comandado pela população francesa, de maioria católica, episódio conhecido como
a Noite de São Bartolomeu, em 1572, quando cerca de trinta mil protestantes foram
assassinados.
A situação só foi pacificada com
a ascensão de Henrique de Bourbon ao trono francês. Ao assumir o trono como
Henrique IV, o rei, de origem protestante, manteve o catolicismo como religião
oficial, mas garantiu relativa tolerância aos huguenotes. Através do Edito de
Nantes, ainda que de maneira limitada, direitos religiosos, civis e políticos
foram garantidos aos protestantes. Abria-se, assim, espaço para o
fortalecimento do poder dos reis franceses, após o m dos problemas internos. A
tolerância estabelecida só foi interrompida no reinado de Luís XIV, que,
através da edição do Edito de Fontainebleau, revogava o Edito de Nantes,
ordenando a destruição de igrejas huguenotes e o fechamento de escolas
protestantes.
Ao refletirmos sobre o jogo político-administrativo
monárquico, percebemos que o absolutismo francês definiuse ao longo da dinastia
dos Bourbons, mas sua construção paulatina deparou-se com a disputa de diversas
famílias nobres ligadas ao poder vigente. Isso comprova o quão duradoura ainda
era a influência política dos nobres sobre a monarquia em curso, que, com a
Reforma, diluiu-se em meio ao conflito entre protestantes e católicos. A
promulgação do Edito de Nantes, na medida em que pacificava a oposição entre os
nobres, impulsionava o absolutismo até que ele chegasse ao seu ápice no solo
francês.
Retomando o reinado de Henrique
IV, é válido ressaltar que ele se caracterizou pela centralização
administrativa e pelo incentivo ao comércio e à agricultura. O Estado arrecadou
recursos através da concessão de títulos de nobreza aos grandes comerciantes
enriquecidos, que passaram a formar a nobreza de toga. Ainda assim, seu reinado
terminou de forma trágica, com o seu assassinato.
Luís XIII, seu sucessor, por
ainda ser criança, não poderia assumir o trono, que ficou sob controle do
cardeal Richelieu. Nesse período, ocorreu o fortalecimento do Exército francês
e da centralização administrativa, com a criação de um corpo de funcionários,
os intendentes. A França também se envolveu em um conflito internacional, a
Guerra dos Trinta Anos (1618-1648).
A centralização completa,
entretanto, ocorreu apenas no reinado seguinte, quando Luís XIV assumiu o
poder. Ainda assim, o Rei Sol (como ficou conhecido) enfrentou a resistência de
alguns grupos sociais contrários à concentração de poder, como foi o caso das
frondas, rebeliões iniciadas ainda no período em que o rei era menor.
Aproveitando-se do descontentamento generalizado, setores da nobreza e da
burguesia lideraram campo e cidade contra o absolutismo monárquico. As
revoltas, todavia, acabaram por fracassar.
A centralização promovida por
Luís XIV se realizou por meio do aprimoramento da máquina burocrática,
aumentando o controle dos sistemas de cobrança de impostos e gerando maior
arrecadação para o Estado. Com essa riqueza acumulada, o ministro de Estado,
Colbert, pôde disputar com ingleses e holandeses as áreas do Caribe e do
Atlântico Norte. No plano social, foram reduzidos os controles feudais sobre os
campos e as cidades, auxiliando na eliminação das barreiras que impediam a
circulação das mercadorias pelas várias regiões da França, favorecendo os
burgueses.
A As reformas jurídicas também
estabeleceram um novo modo de relacionamento entre o Estado e a sociedade, pois
a criação dos tribunais ligados ao rei zeram com que os camponeses pudessem
apelar ao monarca diante da opressão dos poderes locais. Colaborando para
engrandecer o absolutismo real, estava a construção da imagem poderosa do rei,
erigida a partir da força da propaganda, dos escritores, historiadores,
escultores e pintores convocados para sua glorificação. De acordo com o
historiador Peter Burke, as obras de arte que retratavam o rei não deveriam
“fornecer uma cópia reconhecível dos traços do rei ou uma descrição sóbria de
suas ações. Ao contrário, a finalidade era celebrar Luís, glorificá-lo, em
outras palavras, persuadir os espectadores, ouvintes e leitores de sua
grandeza” (A Fabricação do Rei, Peter Burke).
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