O PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO NO BRASIL NO INÍCIO DO SÉCULO XX
Até fins do
século XIX, a economia brasileira continuou essencialmente agrária e
exportadora. Na região amazônica, produzia-se e se exportava borracha. No norte
e nordeste, açúcar, algodão, fumo e cacau dominavam. No Rio de janeiro, Minas
Gerais, Espírito Santo e São Paulo, o café ocupava o primeiro lugar. No Rio
Grande do Sul produziam-se couro, pele, mate e se exportava para outras regiões
do Brasil o charque. Porém, no final do século XIX, esse quadro dominado pela
economia agroexportadora começou a se transformar. Entre 1886 e 1894, a
industrialização ganhou impulso, embora a sua origem fosse anterior a 1880.
Contudo, o surgimento e o desenvolvimento das indústrias estiveram intimamente
relacionados ao desempenho daquela economia primário-exportadora. Isso até a
crise de 1929, quando então a economia agroexportadora foi superada pela
industrialização, que passou a ocupar o centro vital da economia.
A industrialização
não ocorreu em todo o país simultaneamente e com a mesma intensidade. O seu
polo dinâmico situava-se no sudeste, particularmente em São Paulo, onde se
localizava a mais poderosa economia exportadora: a cafeicultura.
A economia cafeeira paulista,
desenvolvendo-se no contexto da transição do trabalho escravo para o livre, e
com ampla possibilidade de expansão nas terras férteis do Oeste, converteu-se
na mais próspera das economias agroexportadoras. E, por essa razão, foi ali que
a industrialização desenvolveu-se mais rapidamente.
De início,
a industrialização fazia parte da economia cafeeira, ou melhor, do
"complexo cafeeiro", pois a produção e a exportação do café dependiam
de uma complexa organização de fatores. Além da esfera propriamente de sua
produção, o complexo incluía ainda o seu processamento, um sistema de
transporte (ferrovias), comércio de importação e exportação, bancos e, por fim,
indústrias. O processo de industrialização, por isso, acompanhou o ritmo do
setor exportador - não apenas cafeeiro. Em momentos de expansão, os
investimentos industriais aumentavam, e se contraíam em momentos de retração do
mercado internacional. Até a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), o Estado não
adotou nenhuma política de estímulo à industrialização. No entanto, ela era
estimulada direta ou indiretamente quando o governo aumentava as tarifas
alfandegárias e, sem o pretender, acabava protegendo as indústrias da
concorrência estrangeira, ou quando desvalorizava a moeda nacional
desestimulando as importações, ou então quando adotava as duas medidas ao mesmo
tempo.
A indiferença do
governo em relação à industrialização tinha a ver com o modelo econômico
agroexportador que o Brasil herdara da colônia. Segundo esse modelo, o Brasil
exportava produtos tropicais e, em troca, importava produtos manufaturados.
Essa tradição persistiu na economia cafeeira e, como vimos anteriormente, o
fazendeiro, através de seu comissário, realizava compras para si e para os
escravos nas grandes casas importadoras, que forneciam a quase totalidade dos
produtos de consumo de origem industrial. Portanto, segundo o modelo
agroexportador não havia necessidade de desenvolver a industrialização.
Contudo, a produção em pequena escala de produtos manufaturados estava
disseminada pelo Brasil em pequenas oficinas artesanais.
O primeiro passo
no sentido da industrialização foi dado com a substituição dessa pequena
produção por unidades industriais maiores. E isso começou a acontecer no final
da década de 1870, quando então a abolição da escravatura encontrava-se na
ordem do dia e a solução imigrantista começou a ser considerada como
alternativa. No bojo desse processo, alterou-se também a estrutura do mercado,
com a gradual eliminação do comissário como intermediário no comércio
exportador/importador: os exportadores (estrangeiros) foram direto aos
produtores e os importadores espalharam representantes pelo interior.
Com as poderosas
casas importadoras controlando o mercado, agora em contato direto com os
consumidores, estava claro que o desenvolvimento industrial só seria viável se
contasse com uma rede de distribuição do mesmo tipo. Dessa situação, saíram
duas soluções: a primeira foi a dos próprios importadores montando indústrias,
e a segunda, a dos industriais criando a sua rede comercial, dando origem aos
importadores-industriais e industriais-comerciantes, respectivamente. O
processo de industrialização, que vinha, desde o final do século XIX, crescendo
de acordo com a expansão das exportações, ganhou uma nova direção a partir da
Primeira Guerra.
O primeiro efeito
da guerra foi à drástica redução dos investimentos industriais. A produção,
todavia, se expandiu em 1915-1916 com a utilização plena da capacidade
instalada, mas começou a declinar em 1917 e o seu crescimento tornou-se
negativo no ano seguinte, pela falta de matérias-primas, máquinas e
equipamentos importados.
O principal efeito
da guerra sobre a indústria foi à mudança da atitude do governo. Até então, não
existia o que poderíamos chamar de política industrial. A guerra, entretanto,
evidenciou os limites e as inconveniências de um país destituído de um parque
industrial compatível. Por esse motivo, o governo começou a adotar consciente e
deliberadamente um incentivo para o desenvolvimento industrial, a fim de
promover a sua diversificação. E essa atitude do governo manteve-se ao longo
dos anos 20.
A partir da
Primeira Guerra, as dificuldades políticas do Governo Federal (o
"café-com-leite") aumentaram progressivamente. No Congresso Nacional
as bases de apoio da presidência, relativamente tranquilas nos primeiros
governos oligárquicos, foram se esvaziando. As oposições no Congresso
representavam descontentamentos cada vez maiores das oligarquias regionais que
dificultavam a manutenção da política em prol da cafeicultura. A falta de
dinheiro no governo federal e a diminuição das ações fisiológicas rapidamente
se mostravam. Se as elites, com as óbvias exceções de um pequeno grupo de
cafeicultores, estavam se rebelando politicamente por não suportar mais a
crise, imagine as consequências disso para os setores populares e
médio-urbanos.
Da mesma
forma que as dissidências oligárquicas aumentavam suas oposições ao poder
público, outros movimentos da sociedade faziam o mesmo. O Movimento Operário
eclodia nas cidades que estavam se industrializando e o Cangaço expunha a
falência social no interior do nordeste. O Tenentismo refletia a rebeldia
política não só entre o baixo oficialato das Forças Armadas como também de
setores médios-urbanos da sociedade brasileira. Na mesma linha de raciocínio, o
Modernismo expressava uma ruptura com os valores culturais defendidos pelas
elites que se encontravam no poder.
Comentários
Postar um comentário