TROPICALISMO
Tropicalismo ou Tropicália foi um
movimento cultural brasileiro, concentrado entre os anos de 1968 e 1969, que
marcou profundamente diversas formas de expressão artística, como a música, o
cinema, o teatro, a poesia e as artes plásticas.
Apesar das perseguições políticas
e censura promovidas pelo Estado na época, o movimento da Tropicália não deixou
de fazer debates políticos importantes e produzir leituras críticas sobre as
realidades brasileiras, por meio das suas múltiplas formas de expressão.
Em pleno contexto de Guerra Fria,
com as crescentes ameaças de armas de destruição em massa, tensões militares,
conflitos armados, entre outros, um crescente espírito de contestação surgiu
por meio de diferentes modos de expressão. Com o fim da Segunda Guerra Mundial,
ideias como progresso, desenvolvimento, racionalidade, entre outras,
relacionadas à Modernidade, passam a ser fortemente questionadas diante os
resultados traumáticos dos conflitos que marcaram a primeira metade do século
XX, além das experiências totalitaristas, sobretudo o nazifascismo
Assim, na filosofia, autores como
Frantz Fanon, Michel Foucault, Jacques Derrida, Gilles Deleuze, Herbert
Marcuse, Guy Debord, entre outros, ganharam centralidade no debate político,
com suas fortes críticas ao processo civilizatório, à Modernidade, ao
progresso, à sociedade do consumo, às instituições etc., que passaram a ser
objetos de intensos debates intelectuais em diversas partes do mundo.
Nas artes, floresciam movimentos
em diferentes lugares do mundo cujo principal objetivo concentra-se na
observação política, no debate estético, ora em sua dimensão “pura”, ora em
seus aspectos também políticos, além de um forte espírito de contestação dos
próprios pressupostos modernos. Dessa forma, estávamos diante de novos paradigmas
que precisavam ser formulados.
Esses impulsos traduziram-se
tanto em movimentos políticos, como também em movimentos artísticos mais
pontuais. São exemplos desses tipos de iniciativas, respectivamente: o Maio de
68, na França; a Primavera de Praga, na então Tchecoslováquia; os movimentos de
independência, na África; o Neorrealismo italiano; a Nouvelle Vague, na França;
o Cinema Novo e o Cinema Marginal, no Brasil, além da própria Tropicália — esta
já como um movimento mais amplo, abarcando diferentes tipos de expressões
artísticas.
Todo esse espírito difusor de
ideias e inovação artística foi acompanhado por repressões políticas e quadros
autoritários em diversos países, como no caso do Brasil. Em 1964 houve um Golpe
Militar no país que, no final da década, endureceu ainda mais a tentativa de
controle sobre o que podia ou não ser dito e publicado em território nacional.
Assim, artistas e militantes
tiveram que driblar essa censura. Nesse sentido, o artifício da alegoria foi
uma das ferramentas mais importantes e inventivas, da qual o próprio
Tropicalismo lançou mão como forma de comportar suas visões críticas sobre a
realidade política e social do Brasil; além de ter sido uma forma de contornar
o aparelho da censura.
Dentro de todo esse contexto pós-guerra,
com o desenvolvimento da Indústria Cultural e a introdução cada vez mais
acelerada dos televisores domésticos e do rádio, ampliando o consumo de massa,
o Tropicalismo destaca-se como um marco na história da arte no Brasil, trazendo
tanto novas discussões políticas e estéticas, como também resgatando debates e
abordagens artísticas que tiveram início lá na Semana de Arte Moderna de 1922.
Um dos eventos mais marcantes
para o Tropicalismo foi o III Festival de Música Popular da TV Record de 1967,
no qual foram apresentadas “Alegria, Alegria”, de Caetano Veloso, “Domingo no
Parque”, de Gilberto Gil, e “Roda Viva”, de Chico Buarque, canções de grande
importância para o movimento. O impacto que esses artistas e suas obras tiveram
pode ser claramente notado atualmente, por exemplo, pela presença de seus
principais nomes, como Caetano Veloso e Gilberto Gil, no mercado musical
contemporâneo; pela influência estética na Música Popular Brasileira (MPB), e
pelo reconhecimento internacional em festivais de música mundo afora.
É importante ressaltar que o
movimento da Tropicália não possui unidade objetiva. Não obstante, uma das
principais características que, em grande medida, pode sintetizar esses
propósitos consiste em uma tentativa de reinterpretar o Brasil, ou seja:
redescobrir o país, seus valores, símbolos nacionais outrora esquecidos, heróis
inimagináveis, temas negligenciados. Ao mesmo tempo, havia também uma ideia de
atualização, de incorporar elementos que vinham de fora, no teor da dinâmica
recente da indústria cultural e, de forma antropofágica, devolver ao exterior
uma versão “genuinamente brasileira”.
Nesse sentido, em 1967 houve, por
exemplo, a Manifestação Contra a Guitarra Elétrica, em que integrantes da MPB
questionavam o uso desse instrumento entre os artistas da nascente música
tropicalista. Como símbolo estrangeiro, o instrumento em certa medida macularia
a originalidade da tradição musical brasileira. Contudo, o uso de instrumentos
e influências externas dava-se, como mencionado, de forma antropofágica,
crítica, colocando em perspectiva a cultura brasileira e seus referenciais no
seio do debate sobre a Indústria Cultural, ao mesmo tempo, incorporava-se
fortemente as influências da Bossa Nova. Isso delimita, mais uma vez, a
influência da Semana de Arte Moderna de 1922 sobre os artistas do movimento.
O nome do movimento surgiu de uma
obra ambiência de Hélio Oiticica que recebeu o título de Tropicália, montada em
1967 em uma exposição no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Tempos
depois, Caetano Veloso compôs uma música que recebeu o mesmo nome — outro marco
para o movimento.
Vale ressaltar que grande parte
desses artistas, sobretudo da música, veio especialmente da Bahia, e teve como
cenário as cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, cada uma a seu modo. No Rio,
comportaram-se mais as expressões musicais e as artes plásticas, ao passo que,
em São Paulo, destacaram-se obras do cinema, da poesia concreta e do teatro.
Em junho de 1968, Caetano Veloso,
Gilberto Gil, Torquato Neto, Capinam, Tom Zé, Nara Leão, Gal Costa, Os Mutantes
e Rogério Duprat lançam o álbum Tropicália ou Panis et Circencis — uma espécie
de manifesto musical do movimento. Nessa obra, as principais referências dão-se
como uma mescla entre a música popular brasileira, o rock’n roll, o Concretismo
e a cultura pop.
Nas artes plásticas, podemos
destacar Seja Herói, Seja Marginal e Tropicália (Penetráveis PN2 “Pureza é um
mito” e PN3 “Imagético”), de Hélio Oiticica. É importante destacar também o
livro manifesto do autor de poesia concreta Augusto de Campos, O balanço da
bossa. No teatro, a peça O rei da vela, de José Celso, além de toda sua
influência no Grupo Oficina. E no cinema o Tropicalismo também exerceu fortes
influências, sobretudo, no cinema Cinema Marginal, com diretores com Rogério
Sgarzela, Andrea Tonacci, entre outros.
Apesar dos recursos alegóricos e
do grande impacto da Tropicália na música brasileira, após o acirramento da
repressão da Ditadura Militar, com a promulgação do Ato Institucional nº 5
ainda em 1968, as perseguições políticas acentuaram-se no país e o clima de
tensão aumentou. Em 22 de dezembro de 1969, Gilberto Gil e Caetano Veloso são
presos e, posteriormente, exilados, após se apresentarem em uma boate do Rio de
Janeiro ao lado de Os Mutantes.
O exílio desses dois principais
representantes do movimento acabou marcando o fim de um momento da música
brasileira e, consequentemente, da efervescência cultural da Tropicália.
https://mundoeducacao.uol.com.br/historiadobrasil/tropicalismo.htm
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