O NEOCLACISSIMO PORTUGUÊS
A afectação marcou a literatura
portuguesa da primeira metade do século XVIII, época a partir da qual são
notórias algumas mudanças graduais que desembocariam na grande reforma
literária conhecida como Romantismo. Distintos homens que fugiram para o
estrangeiro para escaparem do despotismo reinante contribuíram para o progresso
intelectual da nação durante os últimos anos do século. Verney criticou, por
exemplo, os obsoletos métodos educativos e expôs a decadência literária e
científica da nação no Verdadeiro Methodo de Estudar, enquanto as diversas
Academias e Arcádias trabalharam por conseguir a pureza do estilo e a dicção e
traduziram melhor os clássicos estrangeiros.
As Academias
A Academia da História,
estabelecida por João V em 1720, à imitação da francesa, publicou quinze
volumes de Memórias e fundou as bases do estudo crítico dos Anais portugueses;
entre seus membros estavam Caetano de Sousa, autor de uma volumosa História da
Casa Real, ou o bibliógrafo Barbosa Machado. A Real Academia das Ciências,
fundada em 1780, fez algo similar com respeito à crítica literária, ainda que
este labor tenha sido levado a cabo fundamentalmente por outras instituições
similares, as Arcádias.
Poesia: as Arcádias
Dentre as Arcádias, equivalente
literário das Academias, a mais importante era a Arcádia Lusitana (também
conhecida como Arcádia Olissiponense) estabelecida em 1756 pelo poeta António
Dinis da Cruz e Silva, com a intenção de "formar uma escola que sirva de
bom exemplo em eloquência e poesia". Esta Academia incluía alguns dos
escritores mais influentes de sua época: Pedro António Joaquim Correia da Serra
Garção compôs uma Cantata de Dido, bem como sonetos, odes e epístolas; os
versos bucólicos de Domingos dois Reis Tira tinham a singeleza e a doçura dos
de Bernardim Ribeiro, enquanto o poema épico-satírico Hyssope, do próprio Cruz
e Silva, satirizava os tipos sociais locais e a galo-mania da época com humor.
As disputas internas levaram à dissolução da Arcádia em 1774, que tinha já, no
entanto, contribuído para elevar a qualidade dos textos e introduzir novas
formas poéticas na literatura portuguesa. Infortunadamente, alguns dos seus
elementos não só imitaram os clássicos greco-latinos e os poetas renascentistas
portugueses mas desenvolveram um estilo frio e cerebral, com expressão
excessivamente académica. Muitos dos poetas da Arcádia seguiram o exemplo do
Mecenas da época, o Conde de Ericeira e dedicaram-se a nacionalizar o
pseudo-classicismo que tinham aprendido em França.
Em 1790 nasceu uma Nova Arcádia,
a que pertencia Manuel Maria Barbosa du Bocage, que poderia talvez ter chegado
a ser um grande poeta em outras circunstâncias. O seu talento levou-o, no
entanto, a reagir contra a mediocridade geral e não se conseguiu elevar a
grande altura de maneira sustentada, apesar de os seus sonetos competirem com
os de Camões. Também foi um mestre da poesia breve e improvisada, que empregou
com sucesso em sua Pena de Talião contra José Agostinho de Macedo. Este
sacerdote era um autêntico ditador literário, e em sua obra Vós Burros ultrapassou
a todos os demais poetas na agressividade de suas invectivas, chegando a ter
tentado substituir os Lusíadas de Camões com uma obra épica inferior, Oriente.
No aspecto positivo, escreveu notáveis obras didácticas e odes aceitáveis e as
suas cartas e panfletos políticos mostram conhecimentos e versatilidade.
Contudo, a sua influência no ambiente literário de Portugal foi mais negativa
que positiva.
Dos restantes membros das
Arcádias, o único autor que merece ser mencionado é Curvo Semedo. Dentre os
"dissidentes" — autores que se mantiveram fora destas Arcádias —, há
três que mostraram independência criativa: José Anastácio da Cunha, Nicolau
Tolentino e Francisco Manuel do Nascimento, mais conhecido como Filinto Elísio.
O primeiro compôs versos filosóficos e ternos, o segundo retratou os costumes e
manias de sua época em quintilhas cheias de talento e realismo e o terceiro
viveu no exílio em Paris mantendo o culto pelos poetas do século XVI, apurando
a língua de galicismos e enriquecendo-a com numerosas obras, originais e
traduzidas: ainda lhe faltasse imaginação, os seus contos ou cenas da vida
portuguesa apresentam um interessante cariz realista e as suas traduções em
verso livre de os Mártires de Chateaubriand são de destacar. Pouco antes da sua
morte converteu-se ao Romantismo e contribuiu para preparar o caminho de seu
sucessor, na pessoa de Almeida Garrett.
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