O CICLO DO OURO
A notícia a respeito das minas de
ouro e de diamante rapidamente se espalhou no território brasileiro e em
Portugal. A consequência imediata dessa situação foi a ampliação do fluxo
migratório, em especial o português, para a região. Calcula-se que, do final do
século XVII até os últimos anos do século XVIII, o Brasil passou de 300 mil
habitantes para aproximadamente 3 300 000. Essa situação exigiu um controle maior
pela Coroa portuguesa, já que, diferentemente da cana-de-açúcar, o ouro era uma
riqueza não renovável, e, portanto, se a tributação fosse perdida, não seria
possível uma segunda arrecadação.
Assim, já em 1702, foi fundada a
Intendência das Minas, órgão português responsável pela gerência das atividades
de exploração da região aurífera. A Intendência apresentava duas atribuições
fundamentais:
• Distribuir as datas de ouro para a extração.
O principal critério para a aquisição desses lotes por seus pretendentes era
ter a propriedade de escravos, que seriam os braços responsáveis pela extração
do ouro. Esse critério favorecia os exploradores com maior poderio econômico e
permitia à Coroa portuguesa maior arrecadação tributária.
• Promover a tributação do ouro, visando
garantir o aumento do erário português.
Nesse sentido, a política
tributária na região das Minas variou conforme as circunstâncias presentes no
decorrer do século XVIII. Naturalmente, a opressão tributária ocasionou vários
conflitos, como a Revolta de Felipe dos Santos em 1720. Destaca-se a cobrança
do quinto, ou seja, 20% do ouro extraído pelo minerador. Para facilitar e
registrar a tributação, o ouro era quintado nas casas de fundição, criadas em
1720.
A Coroa portuguesa também chegou
a cobrar a capitação, caracterizada pela cobrança de 17 gramas de ouro por cada
cabeça de escravo. A ganância lusitana chegou ao auge quando se estabeleceu a
finta em 1750, que consistia na arrecadação anual mínima de 100 arrobas de ouro
(1 468,9 Kg). Caso essa cota não fosse atingida, seria realizada a derrama,
marcada pela cobrança de impostos atrasados e confisco do ouro até atingir a
meta estabelecida pela finta. A Coroa também cobrava impostos para a circulação
de mercadorias na região das minas, conhecidos como impostos de entrada.
A mineração foi marcada pela
fundação de núcleos urbanos em torno das principais áreas de exploração do
ouro, como Vila Rica, Mariana e Sabará. A formação dessas cidades exigia a
necessidade de abastecimento, visto o considerável número de pessoas dedicadas
a setores vinculados direta ou indiretamente à extração do ouro. A consequência
óbvia dessa situação foi o fortalecimento do comércio intercolonial, com
destaque para a vinda de gado do Sul.
Dessa forma, pode-se notar que a
colônia iniciava o lento processo de integração territorial. Com o intuito de
fácil lucro, muitos fazendeiros intensificaram a atividade agrícola em torno
das minas com o objetivo de abastecer os milhares de habitantes da região. Essa
situação não impediu momentos de precariedade e crises de abastecimento, objeto
de constante preocupação da Coroa portuguesa, já que isso ocasionava
instabilidade sociopolítica.
A relação de trabalho se baseava
na exploração da mão de obra escrava. O universo urbano ocasionava, naturalmente,
novas relações entre senhores e escravos, que reduziam, em algumas situações, o
quadro de opressão tão presente nas atividades rurais. A presença dos escravos
de ganho em setores de comércio e serviço enriquecia a diversidade social das
minas.
Essa situação não esconde a
opressão que muitos escravos sofreram quando foram submetidos a longas jornadas
de trabalho nas minas com o objetivo de enriquecer seus proprietários
mineradores.
A região das Minas também se
destacou pela diversidade social comum do espaço urbano. Comerciantes,
artistas, padres, funcionários públicos, escravos e mineradores se misturavam a
outros estratos sociais, fazendo das minas um espaço até então nunca visto no
território colonial, com o nascimento de uma cultura urbana, dotada de suas
próprias peculiaridades e promotora de uma maior circulação de informação e
conhecimento.
A historiogra a tradicional
vincula essa variação populacional e cultural a uma maior possibilidade de
ascensão social, visto a riqueza imediata que o ouro representava e as inúmeras
atividades econômicas que surgiram em torno do ouro. A despeito dessa situação,
cabe ressaltar que o escritor Sérgio Buarque de Holanda referencia que os
negócios em torno do ouro e dos diamantes ocupavam apenas 1/3 da população,
sendo que o restante vivia de atividades secundárias à mineração.
Justifica-se, portanto, a
afirmativa de Celso Furtado de que, apesar da intensa utilização do trabalho
escravo na extração do ouro, esse tipo de mão de obra não constituiu a maioria
na capitania das Minas.Porém, é valido lembrar, conforme muito bem analisa a
historiadora Laura de Mello e Souza em sua obra Desclassificados do ouro, que o
quadro social das Minas era fortemente marcado pela marginalização de grande
parte da população, que, a despeito de toda a riqueza que o ouro representava,
cava mergulhada em profunda pobreza. É o chamado falso fausto, ou seja, o
esplendor das Minas não foi, necessariamente, o enriquecimento de uma
sociedade.
Entre 1740 e 1770, ocorreu o auge
da mineração no Brasil. Após essa fase, a atividade aurífera entrou em crise.
Vários fatores contribuíram para esse novo cenário, com destaque para o
esgotamento do ouro de aluvião, retirado nos barrancos e nas encostas de rios,
e para as técnicas rudimentares que inviabilizavam a exploração do ouro em
regiões subterrâneas, como viria a ocorrer a partir do século XIX. A retração
econômica da região não significou o desaparecimento dos núcleos urbanos, mas
assinalou o m de uma importante fase do sistema colonial português na América.
É importante lembrar que grande parte da riqueza produzida no período acabou
por ser transferida para a Europa, sendo parte componente do processo de
acumulação de capital pela Inglaterra.
Comentários
Postar um comentário