FRAGMENTAÇÃO DA UNIÃO SOVIÉTICA
O processo de desagregação da
URSS está relacionado muito mais às suas estruturas internas do que a fatores
externos. Em primeiro lugar, no plano ideológico, o socialismo não cumpriu a
tarefa a qual havia proposto de transformar a sociedade distribuindo riquezas
de forma mais igualitária. Assim, a população soviética esperou por mais de
sessenta anos por transformações que, na verdade, não aconteceram, gerando
insatisfações sociais.
É importante ressaltar, ainda,
que a União Soviética era um Estado multinacional, composto de várias etnias,
línguas, culturas e religiões. À época da Revolução Russa, isto não parecia ser
um problema, já que Lênin havia se comprometido a respeitar a autodeterminação
dos povos. Ao assumir o comando soviético, entretanto, Stálin promoveu a
“russificação” da União Soviética, não respeitando as diferenças existentes.
O objetivo de Stálin era criar
uma identidade nacional coesa, uma vez que, para a manutenção de um regime
totalitário, a exaltação do nacionalismo como elemento unificador era
fundamental. Em virtude do desrespeito à autodeterminação dos povos que
compunham a URSS, quando o governo acenou para uma abertura do regime, as
diferentes nacionalidades passaram a se expressar e a exigir maior participação
política e liberdade cultural.
A crise de abastecimento foi um
outro problema enfrentado pelo Estado soviético, que, desde as reformas
stalinistas, passara a priorizar as indústrias bélica, aeroespacial,
petroquímica e siderúrgica em detrimento de indústrias que atendiam as demandas
básicas da população. Dessa forma, a população se via privada diante da
escassez de produtos primários duráveis e não duráveis de primeira necessidade,
ou seja, o regime socialista não atendia as necessidades econômicas mínimas da
população.
A falha socialista ganhava uma
repercussão negativa se comparada com a lógica do capitalismo, através da qual,
aparentemente, o indivíduo pode conquistar o que quiser através do seu poder de
compra obtido por meio do trabalho. Por fim, um outro problema enfrentado pela
URSS foi o gigantismo estatal, já que, para se manter, o governo autoritário e
centralizador teve de desenvolver uma estrutura burocrático-administrativa
enorme e complexa, o que, na prática, significou a elevação dos gastos
governamentais com o funcionalismo público e com o militarismo, deixando, com
isso, de investir em setores sociais como saúde, alimentação, transporte e
infraestrutura para as forças produtivas.
Em 1982, período em que as estruturas
do Estado soviético já se encontravam abaladas, Brejnev veio a falecer. As
incertezas estruturais se refletiram na disputa sucessória, e foi somente três
anos após a morte de Brejnev que o alto comando soviético conseguiu uma
liderança estável. Em 1985, um jovem advogado chamado Mikhail Gorbachev assumiu
a liderança da URSS e, assim, deu início a um governo marcado por diversas
reformas liberais.
No campo institucional, Gorbachev
idealizou a Glasnost, programa de abertura política que prezava pela transparência,
abrindo espaço para debates políticos e para a realização de críticas ao
Estado. Já na esfera econômica, o líder soviético implantou a Perestroika, que
consistia em uma abertura da economia das repúblicas que compunham a URSS no
intuito de modernizar as suas estruturas produtivas.Em continuidade às suas
reformas liberais, em 1986, Gorbachev se propôs, unilateralmente, a cessar os
testes nucleares subterrâneos, o que, na prática, significou a primeira de uma
série de medidas visando ao desarmamento soviético.
Apesar de serem bem-vistas pela
ala liberal e pela opinião pública dos países capitalistas, as reformas
iniciadas por Gorbachev não eram apreciadas pelos dirigentes da velha guarda
socialista. Assim, em agosto de 1991, as forças conservadoras aplicaram um
golpe político, fazendo o líder soviético prisioneiro e alegando que ele se
encontrava doente e incapaz de dirigir a União das Repúblicas.
Se, em um primeiro momento, a
ação da ala conservadora conseguiu um grande êxito, os dias que se seguiram à
deflagração do golpe foram marcados por inúmeros protestos realizados pela
população soviética, situação que demonstrava aos golpistas a força política
que Gorbachev havia construído em virtude das suas reformas liberais. Diante,
portanto, do apelo popular pela volta do líder legítimo, a ala liberal
soviética, liderada por Boris Yeltsin (presidente da Federação Russa), comandou
um movimento de resistência que, contando com o auxílio de alguns militares,
reconduziu Gorbachev ao governo.
A rápida ação que ocorreu três
dias após a deflagração do golpe ratificou a vitória da ala liberal e
possibilitou que Mikhail Gorbachev e Boris Yeltsin comandassem o processo de
desmantelamento do Estado soviético. Percebendo a instabilidade institucional
soviética, em setembro de 1991, Estônia, Letônia e Lituânia declararam-se
independentes e buscaram se integrar à União Europeia, que, naquele momento, já
apresentava uma sólida estrutura.
A separação das chamadas
“repúblicas do báltico” representou, ao mesmo tempo, um grande avanço para as
suas economias e um duro golpe para a URSS, que sentia a iminência da
desagregação do bloco socialista. Assim, tentando manter os vínculos econômicos
com os seus exmembros, em dezembro de 1991, os presidentes da Rússia, Ucrânia e
Bielo-Rússia, reunidos na cidade de Brest, criaram a Comunidade dos Estados
Independentes (CEI), um órgão de cooperação econômica que visava ao auxílio
mútuo entre as repúblicas que se desagregavam da URSS.
Esse ato representou, na prática,
a preocupação do Leste Europeu no que se referia à sua inserção no mercado
capitalista, da mesma forma que evidenciava a fragmentação latente do grupo de
países que havia sido formado sob a orientação de Lênin durante a década de
1920 e consolidado por Stálin após a Segunda Guerra Mundial. Apesar de todas as
evidências de fraqueza demonstradas pela URSS, foi no Natal de 1991 que
Gorbachev realizou um anúncio oficial, através do qual renunciou ao cargo de
presidente e comandante-chefe das Forças Armadas e declarou o desmantelamento
da União Soviética, um país que, na prática, não existia mais.
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